quarta-feira, 29 de abril de 2009

Deveria existir uma só palavra entre o bem e o mal

Era fim de tarde e me sentei para ler. Peguei o texto e uma caneta, pois segurá-la parece ser a maneira mais rápida e eficiente de manter também o meu corpo, além das minhas ideias, envolvido com o afazer. Lá fui eu e enquanto lia as palavras de Edgar Allan Poe sobre a composição de seu poema O Corvo outras idéias também iam me invadindo a mente. Imagens das nossas aulas foram se apropriando de mim enquanto eu tentava me apropriar do texto. Inspiração, dom, arte, escrita e assim por diante. De repente me vi perguntando: Por que seria a beleza de um poema menos bela ao saber-lhe uma equação matemática? Não tem a matemática também sua beleza?E foi assim que mais uma ideia, não muito clara, começou a brotar. Há algo na nossa cultura que alimenta constantemente uma cisão entre o bem e o mal, o certo e o errado. Há algo que não posso nomear ainda, mas que me faz ver que somos muito mais frutos desta cultura do que imaginamos. Nós somos a nossa cultura, somos mais um capítulo de uma história que continua. Parece-me que dentro do nosso inesgotável universo humano algumas coisas se instauraram e perpetuam com tanta delicadeza que quase não podemos percebê-las. Assim como criamos nossos mitos, criamos e sustentamos também determinadas criações como se fosse algo além da nossa capacidade. Há uma evidente necessidade de que algo maior se coloque adiante e assim nós, juntamente com os escritores mais “vaidosos” ficamos discretamente estancados em papéis imóveis, embalados em uma película de coexistência.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Eu não tinha pensado nisso

Agora queria saber se, ao escrever, as escolhas que faz do "como dizer" traduzem o que você observou. Ou seja, as escolhas ocorrem em função da beleza ou da precisão? Como você negocia isso? Entende o que digo?
Márcia Fortunato


Sabe Márcia, eu ainda não tinha pensado neste assunto com tanta clareza quanto a que você fez a pergunta.
Quando comecei a escrever eu tinha apenas ideia de onde queria chegar, mas agora, trocando em miúdos, não me resta dúvida de que estava atrás da precisão.
De nada me seria útil a minha escrita fosse ela frouxa, com intermináveis variantes. Pouco ela me esclareceria se não trouxesse consigo combinações de palavras cuidadosamente planejadas.
Eu não escrevo sempre do mesmo jeito até porque eu não escrevo sempre sobre o mesmo assunto, mas em todos os casos a precisão me parece imprescindível.
Tenho um apreço particular por ela. Não pelo seu caráter urgente, de precisar tanto que se torna um precisar grande: precisão.
Eu gosto da fina justeza que ela guarda em si, nem mais nem menos. Seria então exatidão? Quem sabe...
Sobre a beleza? Bom seria se pudesse sempre incluí-la, mas algumas vezes escrevo também sobre assuntos ou situações onde ela não cabe. Pelo menos em um primeiro momento. Quem sabe uma busca minuciosamente precisa faça-a brotar por fim?
Thais Abrahão

quarta-feira, 8 de abril de 2009

O Encontro

Conforme escrevo, vejo assim aparecer diante de mim a mais pura forma humana. A escrita é do homem e somente para ele. Qualquer que seja seu caminho só há uma maneira de alcançá-la: ser humano.
Sim, há diferença nos caminhos. Mais que isso, há também no homem a profunda necessidade de nomear. Afinal de contas, sobre o que escreveria não fosse sobre suas brilhantes criações? E como dela falariam não fossem seus singulares nomes?
A escrita é por si só a mais profunda criação humana, ou seja, a construção da escrita só é viável a partir da mão de um homem e, a meu ver não há homem que não seja um misto de duas poções que se arranjam em equilíbrio peculiar para cada um.
Não há um único tecido que se faça de apenas um fio. Para haver um tecido é necessária uma trama de muitos fios, assim como para haver um texto é necessária uma costura da razão com emoção.

O homem é o tecido que se forma desta trama costurada cuidadosamente e assim como há uma imensa variedade de tecidos, há também a enorme variação de estilos.
Acredito que hajam aqueles que lêem racionalmente. Para estes determinados textos.
Outros escrevem emocionalmente e assim criam textos nunca dantes lidos.
É preciso, sem nenhuma dúvida, saber-se homem para escrever. É necessário aproximar-se de si mesmo. Os escritores são feitos de leitores e vice-versa. Para saber o que escrever é preciso saber do outro e só se pode saber do outro quando se sabe de si.
Sim, os caminhos que compõem o processo de criação podem ser inúmeros. Nem mesmo entre os que escrevem de maneira semelhante há um consenso.

Cada um à sua maneira e sempre no um há de se encontrarem todos.